sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

ADIAMENTO


Olhar-te bem nos olhos: que voragem!
Ouvir-te a voz na alma: que estridência!
É tão difícil termos coragem
de nos vermos enfim sem compalcência.

É tão difícil regressar de viagem,
e descobrir no rastro tanta ausência...
Mas os meus olhos, súbito, reagem.
À tua voz chega o silêncio e vence-a.

Nos pulsos vibra ainda o mesmo rio
que no delta dos dedos se extasia
e moroso reflui ao coração.

O gesto de acusar-te? Suspendi-o.
Mas foi só aguardando melhor dia
em que tenha lugar a execução.

DAVID MOURÃO FERREIRA, in INFINITO PESSOAL (Guimarães Ed., 1962), in OBRA POÉTICA (Ed. Presença, 2006)

Sem comentários:

Enviar um comentário