domingo, 7 de abril de 2013

AUSÊNCIA


Eu haverei de erguer a vasta vida
que ainda é o teu espelho:
cada manhã hei-de reconstruí-la.
Desde que te afastaste,
quantos lugares se tornaram vãos
e sem sentido, iguais
a luzes acesas de dia.
Tardes que te abrigaram a imagem,
música em que sempre me esperavas,
palavras desse tempo,
terei de as destruir com as minhas mãos.
Em que ribanceira esconderei a alma
pra que não veja a tua ausência,
que como um sol terrível, sem ocaso,
brilha definitiva e sem piedade?
A tua ausência cerca-me
como corda à garganta.
O mar ao que se afunda.

JORGE LUIS BORGES, in FERVOR DE BUENOS AIRES, in OBRAS COMPLETAS I 1923-1949, trad. de FERNANDO PINTO DO AMARAL (Teorema, 1998)

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